Entrevista com o marqueteiro Edson Barbosa, responsável pela campanha de Ana Júlia ao governo do Pará. No Diário do Pará de hoje, página A 4

"Faltou política de relacionamento com a sociedade"

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Olho: "Essa crítica por sermos de fora é apenas xenofobia, coisa pequena, que não engrandece as pessoas”.

Olho: "Na campanha, houve um distanciamento do Jader. A eleição foi pau a pau e a Ana poderia ter vencido, não fosse a exclusão de um dos mais importantes - senão o mais importante - atores políticos do Pará”.

Responsável pela campanha de Ana Júlia, Barbosa rebateu críticas feitas por Chico Cavalcante e apontou erros no governo que influenciaram na candidatura petista

Olho: "Essas críticas do Chico o diminuem como profissional porque são críticas descuidadas de uma realidade que ele não estudou".

Dono da empresa baiana Link, o jornalista Edson Barbosa foi o responsável pela comunicação da campanha da petista Ana Júlia Carepa ao governo do Pará. Após a derrota, foi alvo de uma série de críticas, entre elas, as disparadas pelo marqueteiro do PT, Chico Cavalcante. Em entrevista a este jornal, publicada no domingo, 7 de novembro, Cavalcante responsabilizou a Link e Barbosa pelos resultados eleitorais que tiraram de Ana Júlia a cadeira de governadora do Pará. Da Bahia, para onde voltou logo após a eleição, Barbosa conversou, por telefone, com a repórter Rita Soares. Falou das dificuldades da campanha, apontou erros da política, ressaltou os acertos da comunicação.

P: Ana Júlia concorria à reeleição, tinha o apoio de 14 partidos e do governo federal. Em sua opinião, por que ela perdeu as eleições?
R: Não é o caso de ficarmos pensando apenas por que ganhou ou por que perdeu. Os motivos são variados. Eu me recuso a ver eleição como uma gincana. O governo de Ana Júlia representou uma mudança no jeito de se fazer política e de governar o Pará. Foi formado por uma composição dispar. Estabeleceu conflitos com setores tradicionais da sociedade, sobretudo com a grande imprensa e não soube construir pontes. Ana Júlia confiou no processo de gestão descentralizada, sem atentar para a necessidade de dar centralidade ao governo. Por isso, ficou vulnerável aos atores e interesses políticos das partes que não unificaram com a proposta central de um projeto de governo. As disputas na gestão deixaram vulnerável a figura da governadora e geraram dificuldades para que as pessoas percebessem o governo. Eu não sei quem atendeu quem na comunicação do governo. Não vou sair culpando pessoas. O que posso dizer é que, de acordo com percepção do governo, a comunicação foi insuficiente.

P: Quando a Link chegou ao Estado, que cenário encontrou em termos de imagem do governo?
R: Chegamos ao Pará em março deste ano. Fomos contratados pelo Diretório Nacional do PT, preocupado que estava com os níveis de avaliação da imagem da governadora e do governo. Queriam uma avaliação. Implantamos um programa intensivo de pesquisas qualitativas e quantitativas e tivemos um diagnóstico muito negativo de avaliação do governo e da governadora. O governo não comunicava suas grandes conquistas. Ana Júlia fez o maior programa de inclusão digital do País (o NavegaPará) e a sociedade não sabia. O Pará bateu todas as metas de crescimento do Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica), mas não estabeleceu uma comunicação que permitisse, à sociedade, compreender o tamanho do esforço do governo. Outro exemplo foi a regularização do setor fundiário. Ana Júlia mudou a matriz do desenvolvimento econômico ambiental do Pará. Conseguiu trazer uma siderúrgica para Marabá, mas isso se perdeu em meio às disputas políticas. A minha sensação é de que, no Pará, o processo é feito em cima de personalidades e não de projetos.

P: É possível apontar quais os erros na comunicação do governo e de que forma eles interferiram na campanha?
R: Houve insuficiência de comunicação. Faltou política de relacionamento com a sociedade. O governo comprou brigas com vícios tradicionais da política paraense, mas houve pouca mediação. O governo se dividiu em três partes: os partidos aliados, que desejam criar uma liderança para suceder Ana Júlia; o Campo Majoritário (tendência petista), que desejava ser protagonista do governo, e o pessoal da DS (Democracia Socialista, tendência da qual Ana Júlia faz parte) se achando, muitos deles, professores de Deus. Ao invés de mediar, acirravam as discussões. Ana Júlia teve que agir como mediadora. Enquanto cuidava dos grandes temas, ainda precisava cuidar dessas questões específicas. Por que o governo teve avanços na segurança pública e defesa social? Porque nessa área, o conflito era menor. Nas políticas que implicavam mediação, ela foi infeliz, não no estabelecimento da política, mas no resultado das ações. As brigas políticas internas não permitiam que houvesse um reconhecimento das qualidades do governo num processo quase que de autofagia do PT. E quem pagou o pato? A Ana, que assumiu todo o desgaste. Aqueles que deveriam dar suporte político à governadora agiram no limite da irresponsabilidade política. Capitalizavam os acertos, deixavam que Ana assumisse o desgaste.
Na campanha, houve um distanciamento do Jader. A eleição foi pau a pau e a Ana poderia ter vencido não fosse a exclusão de um dos mais importantes - senão o mais importante - atores políticos do Pará. Você tem dúvida de que, se no domingo, antes da eleição, Jader tivesse batido na mesa e declarado voto em Ana, as coisas poderiam ter sido diferentes?

P: Passada a eleição e analisando o trabalho, que erros e acertos da Link o senhor apontaria?
R: Não é uma questão de erro ou de acerto. Fomos chamados para análise e consultoria, com absoluta concordância da governadora e de sua assessoria. Recomendamos uma unidade forte da gestão e interação com a sociedade, para que, entre os meses de abril e junho, se criasse uma plataforma que permitisse à Ana se apresentar como candidata que pudesse reunir uma frente de partidos. Lembre que, em final de junho, Ana compôs uma frente com 14 partidos, demonstrou força política, por esforço dela, sem ajuda nacional. Ali foi concluída a primeira etapa. No início de julho fomos consultados, aí já pelo PT do Pará, sobre se toparíamos contribuir com a campanha. Dissemos que sim, desde que houvesse condições mínimas, isto é, planejamento, pesquisas quantitativas e qualitativas. Nossa proposta foi aprovada por unanimidade. A campanha de Ana era diferenciada na política e na gestão. Havia cenários regionais difíceis, como no Baixo Amazonas. Tínhamos que trabalhar o embate com o Juvenil (Domingos Juvenil, candidato do PMDB ao governo) e o Fernando Carneiro (do PSol), respondendo aos ataques, mas preservando as condições para uma possível vinda do PMDB e do PSol no segundo turno e, ao mesmo tempo, nos defender dos ataques da campanha do Jatene e ainda mostrar o que o governo tinha feito.

P: O fato de a governadora ter contratado uma agência de outro Estado foi alvo de críticas do mercado e até entre alguns petistas. Como o senhor responde a essas críticas?
R: Isso foi apenas de algumas pessoas. Isso é fruto de preconceito, racismo. O Chico Cavalcante (em entrevista ao DIÁRIO, culpou a Link pela derrota de Ana Júlia) atendeu ao PT nacional, foi fazer campanha no Amapá, em Rondônia, no Maranhão. Isso não representa qualquer desrespeito aos profissionais de lá. Essa crítica por sermos de fora é apenas xenofobia, coisa pequena, que não engrandece as pessoas. Isso não implicou desaprovação por parte do cliente. E é bom que se diga que, em nenhum momento, ignoramos o caldo de cultura do Pará. A campanha tinha pessoas de todo o País, mas coordenadores fundamentais eram paraenses. No jornalismo, por exemplo, estava Ruth Viera; a produtora (responsável pela direção de imagens da campanha) era a Digital, do Fernando Pena de Carvalho; tínhamos o Glauco Lima, diretor de criação. Das 126 pessoas que formavam a equipe, acho que só umas 25 eram de fora. Todos participavam, opinavam.

P: Por que o senhor só veio para o PA no 2º turno?
R: No primeiro turno eu estava acompanhando o trabalho em Pernambuco. Tinha um contrato lá, mas todas as ações foram acompanhadas de perto.

P: Paulo Rocha era um dos favoritos para a eleição ao Senado e perdeu. Houve erro na condução dessa campanha?
R: Quando chegamos ao Pará, Paulo Rocha tinha 17% das intenções de votos e teve mais de 1,7 milhão de votos. Ele foi colhido pelo problema da ficha limpa. Em nenhum momento, o Paulo fez qualquer reclamação sobre a produção da campanha dele. Acho que se o Paulo tivesse aceitado a oferta do DEM, de se aliar a Valéria, ela teria tirado pelo menos 15% dos votos de Flexa e o Paulo poderia ter sido eleito.

P: A participação de Almir Gabriel não foi um erro? Ele atrapalhou?
R: Ajudou muito. Teve uma participação muito substantiva na campanha e representava uma força política importante. Ana Júlia precisava somar. Não ajudou mais porque o Jatene não embarcou na provocação (sobre Jatene ser preguiçoso). Almir fez o governo mais bem avaliado da história recente do Pará.

P: As críticas do publicitário Chico Cavalcante ao trabalho da Link chegaram ao senhor?
R: O comando da campanha pediu que o ouvíssemos. Foi organizada uma reunião. Ele disse tudo que queria. Mandou texto para todos, sem nenhuma censura. As ideias foram expostas e o cliente disse “não quero desse jeito”. É correto, honesto, legal, dizer que a Link o vetou? Nós sempre deixamos o cliente muito à vontade para fazer campanha com quem quisesse. Em nenhum momento vetamos a participação de quem quer que fosse, apenas dissemos que, para ter a responsabilidade total, a condução do processo precisaria ser nossa.

P: Na sua avaliação, Ana Júlia saiu da campanha maior do que entrou?
R: Nós ganhamos o segundo turno da eleição. Em pouco mais de 15 dias, Ana foi de 36 para mais de 44 pontos. Cresceu oito. Jatene foi de 49 para 54, cresceu cinco. Nessa batalha, ficou oito a cinco. E lembre-se que o Ibope dizia que Ana perderia por 18 pontos. Ela perdeu por 10. Qual a qualidade técnica do Instituto que traz um resultado desses? Isso não está em nenhuma margem de erro e seria suficiente até para uma interpelação jurídica. Veja que eles não divulgaram boca de urna porque seria uma desmoralização. Não quero dizer se isso interferiu ou não no processo, mas deixo a informação no ar.
Ana perdeu por volume de votos em três cidades governadas por aliados: Belém, Parauapebas e Santarém. Qual a culpa de Ana em não ter os votos nessas cidades? A base de prefeitos dela tinha rejeição muito pior que a sua própria. Quando chegamos ao Pará, encontramos baixa intenção de votos, menos de 15%; alta rejeição, acima de 60% e avaliação negativa do governo. Essa é uma mistura explosiva. Em vários aspectos, pode-se dizer que Ana venceu essa mistura.

P: O senhor guarda alguma mágoa do tratamento recebido pela Link no Estado? Tem planos de voltar a trabalhar no Pará?
R: Mágoa nenhuma. Trabalho no Pará alegre e feliz. Tivemos uma experiência técnica extremamente qualificada. Pautamos a campanha no segundo turno. O governo Lula foi reconhecido no Pará. Dilma venceu no Pará. A comunicação não ganha nem perde eleição. Dizer isso é vaidade desses que se intitulam marqueteiros. Essas críticas do Chico o diminuem como profissional porque são críticas descuidadas de uma realidade que ele não estudou. As críticas do Chico, infelizmente, representam uma agressão a quem menos merece - Ana Júlia -, sobretudo vindo dele

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