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Jose porfiro · @JPorfiro

19th Feb 2013 from Twitlonger

A GUERRA FRIA DAS MOEDAS
por Bruno De Conti

A despeito da retórica pacifista da reunião do G-20, cada país seguirá usando as armas que dispõe, numa espécie de "guerra fria das moedas"

Valor Econômico - 19/02/2013

Em 2010, o ministro Guido Mantega declarou que o mundo vivia uma "guerra de moedas". A declaração repercutiu e os encontros do G-20 desde então têm esse tema no centro do debate. Na reunião de Moscou, encerrada neste fim de semana, foi declarado o fim dessa guerra. Mas será que podemos crer nesse armistício? Quais os aspectos envolvidos nessa guerra?

As declarações associadas à guerra de moedas fazem referência aos conflitos internacionais relativos às taxas de câmbio. À época da declaração de Mantega, o já antigo litígio entre EUA e China começava a se espraiar e ele hoje envolve o euro, o iene, o franco suíço e mesmo algumas moedas periféricas. Contudo, as discussões cambiais não são o único dilema dessa guerra. Há três particularidades da moeda cuja compreensão é crucial para o estudo da economia capitalista e que fazem da guerra das moedas algo muito mais abrangente.

As armas brasileiras são a administração cambial e a manutenção de controles na conta financeira, mas que devem ser conjugados a um esforço permanente pela redução do uso do dólar no comércio e nas finanças internacionais - ao menos na América Latina

A primeira particularidade da moeda diz respeito à dupla face de seu valor: a interna, relativa aos preços domésticos; e a externa, relativa às demais moedas nacionais. Para os negócios internacionais, sua face externa é a mais importante e ela se refere à taxa de câmbio em relação às outras moedas. Vê-se, assim, que a questão mais comumente associada à guerra de moedas é efetivamente importante, dentre outras coisas, porque as taxas de câmbio são um elemento essencial para a competitividade externa de cada país. No período entre guerras, as desvalorizações cambiais competitivas foram frequentes, num esforço dos países para recuperar os níveis pretéritos de crescimento econômico. De modo análogo, a crise atual promove o acirramento da competição internacional, recolocando a administração cambial como um importante instrumento. Desvalorizações recorrentes e disseminadas contribuem para o aumento da volatilidade cambial, de modo que a guerra das moedas relaciona-se ao patamar e à volatilidade das taxas de câmbio.

A segunda particularidade da moeda diz respeito a seu grau de liquidez. A moeda é o ativo líquido por definição de uma economia nacional e para a detenção de outros ativos financeiros, os agentes exigem um prêmio para compensar sua iliquidez: a taxa de juros. Quando transacionadas em âmbito internacional, as distintas moedas (e os títulos nelas denominados) possuem também diferentes graus de liquidez, de forma que as taxas de juros que lhes são imputadas são também diferentes. A abertura financeira crescente determina que as taxas de juros dos distintos países sejam cada vez mais conectadas e, ademais, calculadas em relação ao ativo mais líquido da economia mundial. Assim, os países possuem diferentes taxas de juros para seus títulos e também diferentes graus de autonomia para a condução de sua política monetária. Se um país central muda sua taxa básica de juros ("quantitative easing"), pode forçar outros países a seguirem-no. Nota-se, então, que a guerra de moedas toca também a questão das taxas de juros e da política monetária de cada país.

A terceira particularidade da moeda refere-se ao fato de que ela é um instrumento central de poder. Mais ainda: moeda é poder. Por um lado, se o emissor de uma moeda é poderoso, terá condições de estimular o uso de sua moeda; por outro lado, quanto mais essa moeda é utilizada, maior é o poder do país emissor, numa espécie de círculo virtuoso (ou vicioso). As distintas formas que assumiu o Sistema Monetário Internacional ao longo da história são ilustrativas, tanto no que diz respeito às regras e instituições, quanto ao arranjo tácito das moedas à sombra desse sistema. Nos séculos XII e XIII, os Países Baixos tinham uma posição central no comércio mundial, de forma que o guilder holandês era a moeda mais importante do SMI. No século XIX e início do XX, o Reino Unido foi o centro econômico global e a libra esterlina tornou-se a principal moeda. Após as grandes guerras, os EUA consolidaram-se como a principal potência mundial e o dólar passou a ocupar a posição central do SMI, lugar que ainda ocupa. Esses processos de modificação do sistema são lentos e interessantes, já que refletem e reforçam (simultaneamente) as correlações de poder entre os países. Na outra extremidade do espectro está a maioria dos países, cujas moedas não são usadas em escala internacional. Vê-se, portanto, que a guerra das moedas diz respeito também ao uso internacional das moedas e à hierarquia do SMI.

Consequentemente, a guerra das moedas, em sua essência, não é apenas uma questão cambial, mas diz respeito: 1) às taxas de câmbio dessas moedas; 2) às taxas de juros dos títulos denominados nas distintas moedas e à autonomia das políticas monetárias nacionais; 3) ao uso internacional das moedas e à configuração hierárquica do SMI.

Percebe-se, então, que as desvalorizações cambiais e o afrouxamento monetário são batalhas de uma guerra mais abrangente e cuja solução exigiria uma ampla reforma do SMI. Enquanto isso não ocorre, a guerra continuará, de forma silenciosa. A despeito da retórica pacifista da reunião do G-20, cada país seguirá usando as armas que dispõe, numa espécie de "guerra fria das moedas". As armas brasileiras continuam sendo a administração cambial - para evitar a sobreapreciação do real - e a manutenção de controles na conta financeira - que conferem mais autonomia à política monetária doméstica -, mas que devem ser conjugados a um esforço permanente pela redução do uso do dólar no comércio e nas finanças internacionais - ao menos na América Latina - e de transformação desse caráter hierárquico do SMI.

Bruno De Conti é professor do Instituto de Economia da Unicamp e pesquisador do Centro de Estudos de Conjuntura e Política Econômica (Cecon/IE/Unicamp).


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Há sinais de instabilidade na economia mundial
Por Simon Nixon | The Wall Street Journal

Embora o cenário faça lembrar os anos 70, as previsões de uma guerra cambial, como a que ocorreu naquela década, parecem prematuras

Valor Econômico - 19/02/2013


Há uma sensação de volta para o futuro na economia mundial. A única pergunta é: De volta para que futuro? A resposta óbvia, considerando os acontecimentos da semana passada, é os anos 70. Há hoje muitos sintomas da instabilidade cambial, inflação e desemprego em alta e incertezas políticas que marcaram aquela problemática década.

No fim de semana, os ministros da Fazenda e presidentes dos bancos centrais dos países industrializados do Grupo dos 20 tentaram abrandar o receio de novas guerras cambiais que enervou os mercados desde a eleição, no mês passado, do novo governo do Japão. O Banco da Inglaterra se tornou recentemente o último banco a relaxar sua política monetária ao abandonar oficialmente sua antiga meta de trazer a inflação para 2% em dois anos. Enquanto isso, o produto interno bruto da Europa encolheu mais que o previsto no quarto trimestre de 2012, gerando novas dúvidas sobre quando a recessão vai acabar.

Mas não é preciso muita imaginação para também enxergar hoje os vestígios de uma década muito diferente: assim como no começo dos anos 90, a dinâmica ora prevalente nos mercados é uma busca desesperada por retornos mais altos, fazendo inflar possíveis bolhas nos mercados globais. Da mesma forma que, naquela década, o banco central americano afrouxou sua política monetária na esteira do estouro da bolha da internet, hoje os bancos centrais estão novamente inundando o mundo com dinheiro fácil na tentativa de tirar a economia da pasmaceira atual. E, nos últimos dez anos, ficou claro que toda essa liquidez está inflacionando ativos ainda que a inflação ao consumidor continue baixa, provocando temores sobre bolhas em ativos tão diferentes quanto imóveis da Suíça, Canadá e Londres, ações de empresas de mercados emergentes e títulos de dívida de firmas europeias.

Ao mesmo tempo, alguns acreditam que a proposta de compra, por US$ 28 bilhões, que Warren Buffett fez pela Heinz talvez marque o início de um novo boom gigante de aquisições alavancadas. Sob essa análise, as sementes da próxima crise financeira poderiam estar sendo plantadas antes mesmo do fim da crise anterior.

Então, com que década passada a atual mais se parece? A verdade é que previsões de uma guerra cambial nos moldes da dos anos 70 soam prematuras. É verdade que a declaração do G-20, concebida para acalmar os ânimos, foi branda e não convenceu. O grupo reconheceu que "o excesso de volatilidade dos fluxos financeiros e as oscilações desordenadas das taxas de câmbio têm efeitos adversos na estabilidade econômica e financeira" e fez os governos se comprometerem a "evitar desvalorizações" com o intuito de ganhar vantagens comerciais.

Mas isso ainda deixa muito espaço para futuras desvalorizações, já que elas ocorrem como um subproduto casual da política monetária doméstica, conduzida por razões domésticas, e não como uma tentativa de "dimensionar nossas taxas cambiais por razões competitivas".

De fato, o debate mundial sobre o câmbio é cheio de artimanhas. Os Estados Unidos foram o primeiro país a ser acusado de promover uma guerra cambial, quando o Brasil se opôs à segunda rodada de relaxamento quantitativo do Federal Reserve em 2011, a qual foi amplamente vista como uma tentativa patente de desvalorizar o dólar.

O novo governo japonês pode agora alegar que o imenso estímulo monetário e fiscal que prometeu tem como única meta impulsionar a economia doméstica, mas ele não escondeu o desejo de ver o iene se desvalorizar. Do mesmo modo, o presidente do Banco da Inglaterra, Mervyn King, tem manifestado abertamente sua opinião de que uma nova desvalorização da libra esterlina, a se somar à queda de 20% que a moeda já sofreu desde o começo da crise financeira mundial, é necessária para reequilibrar a economia - ainda que ele alerte que outros países podem realizar desvalorizações competitivas.

Ainda assim, há boas razões para crer que as discussões sobre guerras cambiais, no momento, são só conversa. Primeiro, é difícil argumentar que alguma economia avançada tenha até hoje garantido uma vantagem competitiva significativa através de taxas de câmbio. Mesmo depois da desvalorização de quase 20% do iene este ano, a moeda japonesa ainda está sendo negociada no seu nível de longo prazo, já que foi consideravelmente supervalorizada nos últimos anos ao se tornar um porto seguro para capitais fugindo da crise do euro. De modo semelhante, a ascensão recente do euro não é nada favorável ao crescimento e vem causando ansiedade em alguns países da Europa, mas a moeda também ainda está no seu nível de longo prazo em relação do dólar.

A exceção é o Reino Unido, que acabou escapando da censura internacional apesar de ter tido a maior desvalorização de todas as principais moedas - talvez porque o país tenha aparentemente se beneficiado tão pouco dela.

Além disso, é difícil hoje em dia ganhar uma guerra cambial. Enquanto a inflação mundial continuar baixa, as estimativas de capacidade ociosa permanecerem altas e os bancos centrais estiverem dispostos a ignorar picos temporários de inflação, todo país terá acesso à arma de combate principal: políticas monetárias extremamente frouxas.

De fato, a valorização anterior do iene reflete em parte a relutância do Banco do Japão em expandir sua carteira tanto quanto o Federal Reserve, o Banco da Inglaterra ou o Banco Central Europeu. Ao mesmo tempo, a proibição mundial de desvalorizações competitivas parece assimétrica; países que intervieram para impedir a valorização de suas moedas, como a Suíça, até agora escaparam à censura.

Mas, se o preço de evitar guerras cambiais é uma política monetária ainda mais frouxa, isso traz um outro tipo de risco. A forma com que as autoridades econômicas responderão a possíveis novas bolhas nos preços de ativos será crucial para se determinar se o resto da década será um replay dos anos 70, 90 ou algo mais benigno.

Nessa linha, talvez o desenrolar mais interessante tenha sido a decisão, semana passada, do Banco Nacional da Suíça de impor requisitos extras de capital contra a exposição dos bancos ao mercado imobiliário doméstico. Isso foi uma das primeiras tentativas de um banco central de testar uma grande ideia nova no mundo pós-crise: uma regulamentação macro prudente. Se ela conseguirá esfriar os aquecidos mercados, ainda não se sabe.

E também não se sabe até que ponto os outros bancos centrais estão preparados para usar esses novos poderes. Afinal, bancos centrais até aqui foram em grande parte favoráveis a aumentar preços de ativos para restabelecer a confiança e veem os juros baixos como um incentivo para o investimento. Na falta de um apoio político em casa, as autoridades teriam que ser muito corajosas para argumentar que preços de ativos em alta criam o risco de uma nova alocação inadequada de capital baseada em dívidas.


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TAXA DE CÂMBIO E DOENÇA HOLANDESA [[+ Delfim: câmbio]]
por Luiz Carlos Bresser-Pereira
Nosso desequilíbrio macroeconômico fundamental é a sobreapreciação cambial, que desindustrializa gradualmente o país
Valor Econômico - 19/02/2013
http://www.twitlonger.com/show/l3dmi4




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Analistas não veem guerra de moedas
Por De São Paulo

Apesar da valorização recente do câmbio nos países emergentes - e das queixas de ministros e governantes sobre a enxurrada de dólares e euros posta no mercado pelas nações desenvolvidas para estimular suas economias -, a maioria dos analistas descarta que o mundo esteja presenciando uma "guerra cambial".

Em relatório recente, o economista Christopher Garman, diretor de estratégia e América Latina do Eurasia Group, afirmou que "o risco de uma guerra cambial está superestimado". Ele citou como exemplo o recente afrouxamento monetário no Japão, que em janeiro dobrou sua meta de inflação para 2% neste ano e anunciou um programa de compra de ativos de US$ 144,7 bilhões por mês.

"Há crescentes preocupações de que o afrouxamento monetário no Japão gerará uma série de depreciações competitivas. Mas essa preocupação é exagerada", afirma.

Segundo Garman, a China deve permitir uma pequena apreciação do yuan neste ano, enquanto o Banco Central Europeu (BCE), preocupado com a inflação, não está nem próximo de começar a cortar as taxas de juros para depreciar o euro. Quanto aos emergentes, Garman prevê mudanças na política cambial na Colômbia, Peru, Turquia, Filipinas e Tailândia, com um acúmulo maior de reservas e uma "inclinação a uma política monetária mais suave".

"Eu não concordo com essa caracterização de guerra cambial nem acho que isso seja um processo que tenha que ser manejado de forma intensa", afirma Alberto Ramos, economista-chefe para América Latina do Goldman Sachs. Para ele, "o que países como o Brasil e o Chile têm que fazer para evitar a apreciação do câmbio é procurar ganhos de produtividade". "A Alemanha, antes do euro, conviveu por anos com o marco muito apreciado. E todo ano batia recorde de exportação", diz. "Isso porque fazia o dever de casa, em termos de conter custos laborais, de salário, produtividade, tecnologia e abertura ao comércio."

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