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Jose porfiro · @JPorfiro

18th Nov 2011 from Twitlonger

O reequilíbrio da inovação

por Javier Santiso

Os EUA ainda são o país com mais empresas listadas na Nasdaq (404), mas o segundo lugar é de um emergente, a China, com 37. Logo atrás, outro emergente, Israel (27).

valor econômico, 18-11-2011

A riqueza das nações vem se reordenando a alta velocidade. A atual crise dos países da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) e o avanço das economias emergentes acelera a reordenação do mapa econômico mundial. Há, no entanto, outra revolução silenciosa em andamento: o reequilíbrio da inovação, em direção aos países emergentes.

A inovação, em particular a empresarial, até pouco tempo atrás era uma história mais voltada ao Ocidente. As multinacionais dos países da OCDE concebiam, produziam e comercializavam os produtos inovadores. Pouco a pouco, instalou-se outro modelo: a inovação continuava sendo concebida no Ocidente, mas cada vez mais era produzida nos países emergentes. É o modelo da Apple com seus iPods e iPads, em parte, produzidos em Taiwan, Coreia do Sul ou China. Agora, estamos vendo emergir um terceiro modelo no qual a inovação, crescentemente, não é mais apenas produzida e comercializada, mas também concebida nos mercados emergentes.

Esse deslocamento provoca uma reordenação acelerada das listas de classificação das maiores empresas do mundo. A lista mais recente das cem maiores empresas de tecnologia do mundo elaborada pela "Bloomberg" e "Businessweek" mostra que 44% são de países emergentes. Mais do que isso, uma delas, a chinesa BYD, lidera a classificação, pela primeira vez, à frente da Apple. Depois da empresa dos EUA, vem outra multinacional chinesa, a Tencent, uma empresa de internet que já é a terceira maior do mundo em valor de mercado, apenas atrás do Google e Amazon, e logo à frente da Baidu, também da China. Entre as dez maiores empresas de tecnologia ainda há duas indianas (Tata Consultancy e Infosys). Chama a atenção o fato de nenhuma ser europeia. Multinacionais de Cingapura, Taiwan ou Brasil despontam em quantidades superiores às escassas alemãs, belgas ou inglesas que conseguiram invadir a lista.

[Os EUA ainda são o país com mais empresas listadas na Nasdaq (404), mas o segundo lugar é de um emergente, a China, com 37. Logo atrás, outro emergente, Israel (27). A China tem mais que o triplo de empresas de tecnologia listadas na bolsa do que toda a Europa (11)]

As classificações das empresas de tecnologia mais importantes ou inovadoras, realizadas pelo Boston Consulting Group e pela revista "Forbes", contam a mesma história: a Tencent encabeça o ranking das dez maiores da empresa de consultoria, no qual também fazem parte a taiwanesa Mediatek, a mexicana América Móvil, a China Mobile, as indianas Bharti Airtel e Infosys e a sul-africana MTN. Na lista das dez primeiras da revista, além da Tencent (novamente à frente da Apple e Google), também estão a Natura Cosméticos e a indiana Bharat Heavy.

O fenômeno é maciço e abrange todos os setores. Em 2011, a principal fornecedora para a indústria de telecomunicações deixou de ser dos EUA, França ou Suécia: é da China. A partir de Shenzhen, ao lado de Hong Kong, a Huawei chegou à liderança arrebatando as posições da Alcatel e Lucent (que se viram forçadas a promover fusão) e, mais recentemente, da Ericsson. A sul-coreana Samsung encabeça o ranking de 2011 de maior receita mundial no setor de tecnologia, à frente da Hewlett-Packard (HP), dos EUA. Em 2010, a empresa investiu mais em pesquisa e desenvolvimento do que Intel, Google ou Cisco. O sistema de pagamentos na internet do site chinês Alibaba já é o maior do mundo em termos de valor das transações: a empresa de comércio eletrônico, na qual o fundo californiano Silver Lake acaba de entrar, tem valor de mercado de US$ 32 bilhões, quase o dobro da capitalização do Yahoo (dono de cerca de 40% do Alibaba).

O Brasil é um dos países em que mais se usam redes de relacionamento social na internet, como Twitter, bem à frente dos EUA. O serviço de bate-papo virtual da Tencent possui quase 700 milhões de pessoas registradas, equivalente a todos os usuários do Facebook. A velocidade do fenômeno chama a atenção: tudo isso ocorreu em menos de dez anos.

O mundo da internet tradicionalmente é dominado por multinacionais dos Estados Unidos. A Tencent, entretanto, já exibe capitalização de mercado de US$ 45 bilhões, à frente da eBay e Yahoo. Em Moscou, o russo Yuri Milner vem revolucionando as regras dos capitais de risco para o setor digital, dominado até agora por fundos californianos. Sua Digital Sky Technologies (DST) é dona da mail.ru, listada na Bolsa de Valores de Londres com valor superior a US$ 8 bilhões. Seu fundo de capital de risco é um dos poucos que possui participações no Facebook, Zinga e Groupon.

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A chinesa Tencent (que possui 10% da DST e comprou empresas iniciantes, como a Riot Games, dos EUA, por US$ 400 milhões) lançou também seu fundo neste ano, o Tencent Industry Win-Win Fund, com US$ 760 milhões, para ampliar a compra de empresas em fase inicial de operações. Por sua parte, o conglomerado chinês Alibaba Group Holdings lançou o seu por meio da filial Taobao, com US$ 46 milhões. A Legend Capital, por sua parte, proprietária em parte da Lenovo (na qual possui participação de 42%) levantou outro fundo tecnológico, com €500 milhões, neste ano. Em Cingapura, a Singtel, operadora de telecomunicações, criou em 2011 seu fundo de capital de risco, com mais de US$ 250 milhões, para também expandir as compras de empresas de tecnologia com projetos iniciantes.

Todas essas iniciativas mostram, caso ainda seja necessário, quanto os países emergentes asiáticos vem apostando para ganhar um lugar cada vez maior no mundo do capital de risco e de fornecimento de capital inicial para novas empresas.

Em 2011, os EUA ainda são o país com mais empresas listadas na Nasdaq (404), mas o segundo lugar já é ocupado por um país emergente, a China, com 37. Logo atrás, outro emergente, Israel (com 27). A China tem mais que o triplo de empresas de tecnologia listadas na Nasdaq do que toda a Europa (apenas 11).

O fenômeno não é exclusivamente asiático. O caso da Naspers, multinacional sul-africana do mundo digital, é emblemático: a empresa obtém mais de 70% de sua receita no continente africano, mas multiplicou as aquisições nos mercados emergentes. Possui participação de 45% na Tencent, que comprou em 2011 e já se valorizou mais de 3.100%. Também investiu na russa mail.ru (US$ 390 milhões) e possui 91% da brasileira Buscapé (que comprou por mais de US$ 390 milhões). No Leste Europeu, comprou a Tradus por mais de US$ 1 bilhão em 2008. Atualmente, a Naspers é uma das maiores investidores em empresas em fase inicial de operações em emergentes. Está presente em 129 países e tem receita em torno a US$ 4 bilhões e 12 mil funcionários.

Esses exemplos refletem as alterações do mundo em que vivemos. No futuro, esses grupos e países ganharão lugar (cada vez maior) em todos os âmbitos e setores, incluindo os de tecnologia e de maior inovação. Essa talvez seja uma razão a mais para interessar-se e estar presente nessas economias, onde já não apenas se produz e comercializa inovação, mas também se cria, algo que até agora era exclusividade dos países da OCDE. (Tradução de Sabino Ahumada)

Javier Santiso é professor de economia na Esade Business School



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Por que nossas firmas não inovam?

por Naercio Menezes Filho


Um dos principais problemas do Brasil é o baixo crescimento da produtividade, que decorre, em grande parte, da baixa taxa de inovações das empresas brasileiras


Um dos principais meios para aumentar o crescimento econômico de forma consistente ao longo de vários anos é por meio do crescimento da produtividade. Quando a produtividade cresce, o país produz mais com o mesmo nível de capital e trabalho, e assim sua renda per capita cresce mais rapidamente. Um dos principais problemas do Brasil nas últimas décadas tem sido o baixo crescimento da produtividade, que decorre, em grande parte, da baixa taxa de inovações das firmas brasileiras, apesar da existência de uma série de incentivos. Por que as firmas brasileiras resistem tanto a inovar?

O nosso problema com a produtividade vem de longa data. Pesquisas indicam que a produtividade agregada da economia brasileira vem caminhando a passos lentos desde meados da década de 70. Mais recentemente, entre 1995 e 2005, enquanto a produtividade no mundo avançava a uma taxa de 1% ao ano (mesma dos Estados Unidos) e 1,5% na China, no Brasil ela declinava 0,3% ao ano. Entre 2005 e 2008, o crescimento anual médio da produtividade foi de 4,1% na China e 2,3% na Índia, enquanto no Brasil ela declinou 0,8%. Há algo de errado por aqui.

Existência de fortes barreiras à competição faz com que empresas ineficientes operem na economia

Com relação às inovações, os dados da Pesquisa de Inovação Tecnológica do IBGE (Pintec) mostram que a parcela de firmas inovadoras na indústria cresceu apenas 6,5 pontos percentuais nos últimos 10 anos, passando de 32% no período entre 1998 e 2000 para 38% entre 2006 a 2008. Pior ainda, a porcentagem de empresas do setor industrial que investem em Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) para gerar novas ideias e produtos, passou de 10% em 2000 para apenas 4,2% em 2008.

O mais surpreendente é que nós temos no Brasil um conjunto de leis que se destinam especificamente a financiar a inovação. Tanto a Finep como o BNDES tem vários programas para fomentar a inovação, subsidiando atividades de P&D, inclusive com recursos não reembolsáveis (a fundo perdido). Além disso, o governo federal tem introduzido várias leis nos últimos anos para tentar aumentar as inovações, sem nenhum efeito substantivo. Afinal, por que as empresas brasileiras resistem tanto a inovar?

Parece que no Brasil, ao contrário dos Estados Unidos, não é necessário inovar para sobreviver e crescer. Existem no Brasil fortes barreiras à competição, que fazem com que empresas ineficientes operem em todos os setores da economia. A falta de competição advém da dificuldade de abrir novas firmas e de obtenção de crédito barato para expansão das pequenas empresas existentes. Essas dificuldades são agravadas pelas políticas de favorecimento às grandes empresas, predominante no atual governo. O país protege e subsidia setores que precisariam de mais competição. O recente aumento do IPI para os veículos importados é um exemplo claro de política econômica equivocada nessa linha. Para as empresas que poderiam inovar, é muito mais fácil (e menos arriscado) gastar recursos para obter favores do governo (lobby) do que investir em P&D.

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O outro fator que limita as inovações é a baixa qualificação da nossa mão de obra. A figura ao lado, por exemplo, mostra a relação entre a nota de matemática no Pisa (exame internacional realizado pela OCDE em 2009 com alunos de 15 anos de idade) e o número de aplicações internacionais para patentes na "World Intellectual Property Organization" (Wipo) para alguns países. A relação é bastante clara. Países como a Finlândia e Coreia do Sul têm sistemas educacionais de alto nível e, portanto, facilidade para lançar novos produtos e desenvolver novas ideias. Portanto, têm uma alta taxa de patentes. Por outro lado, países como o Brasil, Argentina, Colômbia e Peru estão na situação oposta.

Em suma, apesar das perspectivas sombrias pela frente, os Estados Unidos tiveram um crescimento de produtividade invejável nas últimas décadas, com lançamento constante de novos produtos, cujo maior ícone foi Steve Jobs. Enquanto isso, por aqui proliferam políticas anticompetitivas, com favorecimento a grupos específicos e empresas gastando recursos com lobby para entrarem no clube. Tudo isto é agravado por uma deficiência crônica de mão de obra qualificada. Por isso as empresas brasileiras não inovam.

Naercio Menezes Filho, professor titular - Cátedra IFB e coordenador do Centro de Políticas Públicas do Insper, é professor associado da FEA-USP e escreve mensalmente às sextas-feiras

email: naercioamf@insper.edu.br

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